sexta-feira, 30 de novembro de 2007

IMPASSE COMPROMETE SUSTENTO DE BARRAQUEIROS


Os dias de sol na capital baiana já não são os mesmos. Em um passeio pela orla da cidade, coberta por tapumes e construções inacabadas, observa-se o impasse instalado nas obras das barracas de praia, que persiste a um ano e dois meses. O que começou como um embargo ambiental, hoje acarreta prejuízos a famílias inteiras, que tiram seu sustento do trabalho nas praias.
Sob a luz do sol da tarde, o barraqueiro José Praxedes parece refletir a situação. Com um olhar perdido no horizonte, ele senta-se sobre o que sobrou de sua barraca, um quadrado de chão acimentado coberto por um toldo com cadeiras e mesas amontoadas. Praxedes conta como os clientes passam, olham, e muitas vezes se recusam a parar na barraca improvisada. “A orla está feia, por isso o movimento diminuiu. O turista vai fazer o que aqui?”, explica.
Barraqueiro desde 1985, Praxedes, de 54 anos, se viu desempregado durante o plano Collor, quando trabalhava no Pólo Petroquímico, e decidiu investir unicamente no empreendimento que já mantinha. Suas reservas do fundo de garantia foram investidas na estrutura física do negócio. Ele mostra notas fiscais e comprovantes de impostos como o DAM (Documento de Arrecadação Municipal), no valor de R$ 1.800, dividido em duas parcelas e pago anualmente.
José Praxedes traz nas mãos uma série de papéis, projetos desenhados por ele mesmo, como sugestões para reorganizar a obra, adequando-a as exigências dos órgãos ambientais, considerando terem sido essas o principal motivo para a interdição das construções. De acordo com o Ministério Público, as construções estavam em área federal e ofereciam riscos ambientais, como redes de esgoto com fossas na areia. Praxedes diz que os barraqueiros estão dispostos a negociar e ceder às exigências. Ele cita o caso dos telhados. A pedido do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), não foram utilizadas telhas de cerâmica, mas sim de um tipo de madeira oriundo de árvores reflorestadas.
O barraqueiro diz não entender por que tanta demora em solucionar o empecilho. Desolado, Praxedes afirma que da barraca sai o sustento de milhares de baianos, não só de donos dos bares, mas também dos vendedores de queijo qualho, redes, artesanato e dos próprios funcionários das barracas. “Eu tenho quatro filhos. Aqui, trabalhando comigo, quem tem menos, tem dois”, conclui. Ao longe, ele aponta uma das filhas, Kátia, 23 anos, e comenta que ela deveria estar cursando uma faculdade. Porém, sua condição financeira atual não permite arcar com essa despesa.
Como um dos profissionais mais antigos e conhecidos da Praia de Piatã, Praxedes participa da comissão de barraqueiros, organizada para representar a classe diante dos órgãos públicos. Ele conta que, em setembro de 2006, as construções foram iniciadas com patrocínio de diversas cervejarias e coordenadas pela prefeitura de Salvador. Agora, o caso corre no Juizado Federal. O barraqueiro queixa-se da falta de sensibilidade do juiz Carlos d’Ávila Teixeira, que conduz as audiências na 13º Vara Cível da Bahia. Segundo informações retiradas do site oficial da Justiça Federal - Seção Judiciária do Estado da Bahia, as principais preocupações do juiz são o meio ambiente, o respeito à lei no âmbito da ecologia e, por fim, o sustento econômico dos comerciantes.
Outro argumento de Praxedes é a questão cultural. “O único lazer do povo pobre de Salvador são as praias. Tem gente que vem até a pé e outros não dispensam o baba, com a cervejinha no final para relaxar”. O barraqueiro conta não ter perdido mais fregueses por ter uma clientela antiga que lhe prestigia. Porém, não descarta a diminuição no número de usuários do serviço, pois, segundo ele, a população está mal informada sobre o assunto. Para Praxedes, a mídia não informa o quanto eles têm cedido, a exemplo da redução no tamanho das barracas, em 5m², e que elas acabaram sendo germinadas, unindo duas em uma.
Apesar de falar “não dá para se desesperar, não depende só da gente”, Praxedes demonstra grande apreensão com o futuro. Após ter investido as economias de toda sua vida na barraca, ele confessa que teria dificuldades em arrumar um novo emprego pela idade avançada. Para quem já atendeu cerca de 14 mil pessoas num reveillon, a situação é decepcionante. Hoje, poucos companheiros de barracas querem organizar o fim de ano na praia.
O natal de Praxedes e de outros barraqueiros pode ficar sem o peru da ceia se o impasse não for solucionado. A próxima audiência está marcada ainda para sete de janeiro e o profissional alerta: “A sala de audiência só comporta 100 pessoas. Só de barraqueiros são 500 e ainda tem os estudantes de direito e jornalistas”. Com isso, Praxedes diz que os barraqueiros pedem mais tempo para argumentar e precisam ser ouvidos, pois, são os maiores prejudicados. O que se sabe é que todos os baianos desejam voltar aos verões tranqüilos com a ida à praia, sobretudo, nos fins de semana, para um merecido descanso.

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