quarta-feira, 18 de abril de 2007

DE ZUMBI A OXÓSSI Crianças aprendem história e cultura afro em sala de aula

- Hoje, quando eu estava vindo pra escola, vi uma macumba.
- Não. Você viu uma oferenda!
Esse diálogo presenciado pela professora fazia parte de uma conversa informal entre dois de seus alunos. Ana Helena dá aulas ao pré II e conta orgulhosa como é comum as crianças reagirem contra desrespeitos a rituais da cultura negra. Elas estudam na Escola Municipal Malê Debalê, que fica no bairro de Itapuã e possui educação infantil, 1ª e 2ª série. A nova postura desses alunos diante da discriminação e do preconceito está sendo possível graças à implementação da lei 10.639, que traz em seu texto diversas alterações a lei 9.394, existente desde 1996. A antiga lei foi criada para incluir a temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Africana” no currículo escolar do ensino fundamental e médio, sua principal e mais comemorada mudança foi tornar-se obrigatória.
Para os meninos e meninas do bairro, que entre 1744 e 1764 abrigou o Quilombo Buraco do Tatu, é a oportunidade de conhecer a história de luta e resistência do povo negro. E orgulhar-se e de descender da raça de heróis como Zumbi dos Palmares. “Desmistificar a idéia do negro coitadinho” é de acordo com a coordenadora da instituição, Isabel Passos, um dos objetivos do ensino, que valoriza a identidade cultural. No entanto, adequar as atividades à nova diretriz curricular não foi tarefa das mais fáceis. Isiane Aline da Silva, diretora da unidade de ensino, diz que os professores chegaram a se reunir aos sábados para fazer grupo de estudos.
A formação de educadores é orientada pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura (SMEC), que montou uma pasta com cerca de 10 textos onde os professores podem obter informações sobre o tema. Outro recurso utilizado pela secretaria para a formação dos mestres foi a parceria com os blocos afros, a exemplo do Malê Debalê – a escola de mesmo nome funciona em suas dependências. Segundo o diretor de educação do Bloco e coordenador da Coordenadoria Regional de Educação (CRE) / Itapuã, Carlos Eduardo Santana, a cooperação com a SMEC tem cerca de dois anos e funciona da seguinte forma: “A Prefeitura entra com a infra-estrutura, e o Malê com os formadores”, que no caso são estudiosos que ministram palestra gratuitamente a pedido do Bloco. O último curso teve 60 inscritos. Pedagogo formado pela UNEB, Carlos Eduardo conta ainda que “quem efetivou a lei foram os blocos afros e as militâncias do movimento negro”. Ele cita que o Malê Debalê dá palestras em escolas públicas desde 1999, quando ainda não existia a obrigatoriedade, e que, portanto, o trabalho só foi ampliado.
Reação dos pais - Marlene Souza, 34, notou a abordagem da nova temática quando a escola passou uma atividade para sua filha contendo histórias da cultura afro-brasileira. A mãe, que freqüenta igrejas católicas e evangélicas, diz não ver problema na educação da filha. “Acho bom, porque ela vai aprendendo, conhecendo e respeitando a cultura dos outros”, comenta. Mas ela revela que em casa nem todos pensam assim. A tia de Emili Souza, de 5 anos, filha de Marlene, é Testemunha de Jeová e não concordou com idéia. Segundo Marlene, sua irmã acredita que estão ensinando candomblé às crianças e aconselha mudar a sobrinha de escola. Apesar disso, Emili continua estudando e se comporta como agente multiplicador, contando tudo que aprende para a família e os amigos.
Professoras da escola Malê Debalê, Flaviane Sudário, afirma ter cuidado para não incentivar o culto. Procurada por alguns pais, ela deixou claro que “não estava ensinando religião e sim cultura, em termo de conhecimento histórico, para desconstruir o preconceito que há”, concluiu. Assim, a fórmula encontrada pelos educadores para seguir as diretrizes curriculares exigidas foi unir a cultura afro-brasileira e africana ao meio ambiente, revelando a ponte existente entre os orixás e a natureza. Dessa forma, os alunos aprendem a preservar o meio ambiente conhecendo a mitologia africana, na qual Oxum, rainha das águas doces, representa a fertilidade da vida. Outra maneira foi usar a simbologia das cores que representam os orixás, verde para Oxóssi, branco para Oxalá, descreve Flaviane.
Uma mostra do aprendizado foi dada durante o Desfile da Primavera 2006, que teve a participação efetiva dos pais e da comunidade. Além desse, a peça teatral chamada “Três Reinos e uma Nação” que contou a história das três raças que construíram o Brasil, e um concurso de redação com a temática “Água e Zumbi”, completaram o ciclo de atividades produzidas a partir dos conhecimentos adquiridos. “Foi um ano em que aprendemos como adotar a lei sem ser agressivo para as crianças”, resume a diretora da instituição.
O trabalho desenvolvido por professores e alunos tem gerado bons frutos. Recentemente, a escola recebeu a visita de representantes do Ministério do Meio Ambiente de Angola e do Brasil. O coordenador de educação do bloco relata que eles vieram conhecer a forma criativa usada para ensinar Educação Ambiental às crianças. Recebidos com música e dança, puderam perceber a alegria dos alunos em demonstrar o que aprenderam.
Educação e conscientização - A escola Malê Debalê foi fundada há um ano e aguarda a construção de sua sede própria, pois ainda funciona nas dependências do bloco, inclusive o letreiro com seu nome tem causado transtornos. Por ficar na fachada principal acaba confundido o visitante de primeira viagem, que se pergunta: Aqui é a escola e onde fica o bloco? A previsão é que as obras sejam iniciadas ainda este ano, num terreno ao lado. Mas, isso não é um grande problema, afirma Carlos Eduardo, que deixa claro o compromisso da entidade com a educação. “O ensino afro é o principal meio de compor os temas carnavalescos do Malê, que consegue assim conscientizar a comunidade quanto ao seu papel social”, completa.
A relevância do aprendizado da cultura e história afro é lembrada também pela educadora baiana Vanda Machado. Doutora em educação, ela pesquisa o tema há 23 anos. Em seu texto “Intolerância religiosa: vigiando e punindo” apresentado no Seminário “Racismo, Xenofobia e Intolerância”, em Salvador no ano 2000, Vanda conclui que só através da educação os brasileiros se tornarão cidadãos conscientes de sua formação cultural e respeitadores dela. O que pode influir tanto na sua alto estima, quanto no convívio em sociedade.

FATO INUSITADO MARCOU O DOMINGO DE CARNAVAL NA AVENIDA

Domingo de Carnaval na Praça do Povo. Era dia de ver as grandes estrelas da música baiana. A chuva que caía não impediu que logo no comecinho da tarde uma multidão se aglomerasse. O comentário mais comum era anunciado aos gritos “quero ver o Chicletão passar”. Depois de blocos infantis e Afros chegou à vez dos grandes nomes da música baiana. O cacique Ninha arrastou o Tribahia acompanhado de Xexéu e Patrícia, dançando sem parar a atriz global Lucy Ramos - convidada do grupo - distribuía sorrisos e beijinhos aos foliões. Em seguida a musa do Axé, Ivete Sangalo, passou rasgando elogios à pipoca que se espremia para ver a deusa em traje de vedete dos anos 40. Com um bom humor inconfundível a cantora retribuía com música o carinho recebido dos fãs, que seguravam cartazes e acenavam das janelas de prédios. Mas, o inusitado ainda estava por vir.
Era a vez do “Chicletão passar”. De longe se ouvia Bel Marques pedir cuidado aos foliões para que não se machucassem ao seguir o trio. O perigo era que eles fossem esmagados ao passar ao lado dos praticáveis montados pela PM. Ao entrar na Praça a banda parecia contagiada pela multidão, no entanto, problemas no trio, logo tiraram o brilho da festa. Uma fumaça preta de cheiro forte se espalhou pelo ambiente. Nesse momento o cantor que se encontrava num braço mecânico – usado pra deixá-lo mais próximo do público - tentava desesperadamente retornar ao caminhão. O nervosismo tomou conta dos que assistiam a cena. Dos camarotes flashs das câmeras fotográficas demonstravam o espanto das pessoas ao presenciar esse momento raro. Depois de alguns minutos parado, o show continuou. O cantor, desconcertado, pediu desculpas e voltou a tocar e alegrar a multidão.
Após algum tempo da partida do Camaleão o Corpo de Bombeiros apareceu. Fora de hora, os soldados percebem que o problema já havia sido resolvido e recuaram. Seguiu-se a festa na Castro Alves...